sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Coluna do A. Magno

O primeiro vôo
A.Magno

Viajar de avião hoje em dia é uma beleza, mas, até meado dos anos sessenta era um sacrifício.
Em junho de 1965, quando fui para o Nordeste, ainda não havia aviões a jato em linhas aéreas nacionais. Tínhamos apenas aviões bimotores e quadrimotores, entre eles o Curtis (DC3) o Douglas (DC4) e o Constelaction (DC6). O DC3 era o mais barato (eram aviões pequenos que foram usados na segunda guerra mundial como planadores no transporte de tropas) e o DC6 o mais caro.
Quando a empresa em que eu ia trabalhar enviou-me a passagem, mostrei–a a um amigo entendido no assunto. Meu amigo analisou-a pra lá e pra cá, balançou a cabeça e disse:
– Bicho, que sacanagem!...
– Sacanagem, por quê? – perguntei meio receoso.
– Bicho!... A Empresa lhe mandou uma passagem de tarifa três e ainda pra acabar de “f” com escalas em Vitória, Ilhéus, Salvador, Aracaju, Maceió e Recife.
A essas alturas, imaginando as decolagens e aterrissagens que iria fazer, indaguei:
– O que significa tarifa três?
– Pô, bicho! Nem isso você sabe? Preste a atenção: Tarifa três é o vôo mais barato que existe o que significa dizer que o avião é um Curtis, velho e cansado de guerra. Entendeu, agora?
Enquanto eu já começava a imaginar “coisas”, meu amigo, pra variar, ainda botou mais lenha na fogueira, dizendo:
– Bicho, reza bastante pra ver se essa “m” desse avião consegue chegar a Recife.
Dois dias depois lá estávamos Bruno, Emil e eu no Aeroporto Santos Dumont, prontos para o embarque, quando Bruno apontando para o nosso avião, comentou:
– Turma, será que essa caranguejola, vai chegar?...
Quando adentramos no avião, Bruno e Emil sentaram-se juntos, enquanto eu me sentei ao lado de um paraibano.
Após algum tempo de vôo, “sacolas de papel” presas atrás de cada cadeira me despertaram a atenção. Aí, perguntei ao Paraíba:
– Gente boa, pra que servem estas sacolas?
– Óxente, meu bichinho, pelo visto “tu nunca andasse” (dialeto paraibês) de avião, né isso?
– Realmente. Mas, e as sacolas?
– Meu bichinho, num se avexe não, porque daqui um pouco mais tu vai saber a utilidade das sacolas. Num se aperreie, não!...
Mal o avião começou a descer para aterrissar em Vitória – nossa primeira escala –, ouvi o som de “vômitos” de uma idosa atrás de mim. De repente, meus ouvidos começaram doer fortemente – como se fossem explodir –, fiquei nauseado e salivando, mas, na minha... Todavia, quando pela segunda vez ouvi e vi um gordão vomitando à minha frente, aí, não suportando mais, botei a mão esquerda na boca e gesticulei para o Paraíba, tentando dizer: E agora, onde vomito?
O Paraíba, antes de se esquivar para outra cadeira, apontou para as sacolas e disse:
– Nas sacolas, meu bichinho!!...
Sem perder tempo, enchi as sacolas e, assim, fui enchendo sacolas a cada aterrissagem que o desgraçado do DC3 fazia até chegarmos em Recife depois de 9 horas de viagem.
Ao desembarcar mais morto do que vivo, ainda ouvi graçinhas de meu companheiro de viagem:
– E aí meu bichinho, aprendesse pra que é que servem as “sacolas”?

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